No projeto de criação de uma interface, qualquer que seja o seu gênero, temos sempre profissionais de usabilidade trabalhando para que as mesmas sejam fáceis de usar, possibilitando uma boa interação entre humanos e máquinas. Porem, um fato importante de se ressaltar é que mesmo que um produto tenha uma interface extremamente simples de se usar, se ele não tiver uma boa utilidade ou não despertar qualquer tipo de desejo nos usuários, essa usabilidade não servirá para muita coisa.
Além de utilidade e do desejo, uma interface pode cativar as pessoas ao uso quando trabalha com boas metáforas e lembranças de memória afetiva, isto é, elementos que remetam os usuários a boas lembranças de sua vida. Justamente por isso, independente da facilidade de uso, quando uma interface tem características semelhantes a outro ser humano, isso facilita a resposta correta de usuários durante a interação. Os seres humanos respondem socialmente as suas interações com máquinas.
Necessidades Sociais
Seres humanos possuem necessidades sociais, como conhecer e se comunicar com diferentes pessoas, expressar sua identidade, ter status e autoestima, dar e receber ajuda, pertencer a grupos e viver em comunidade. Tudo isso são coisas que as pessoas buscam incessantemente suprir no decorrer da vida, e caso elas não consigam, podem tornar-se pessoas frustradas. Para aliviar essa frustração, as pessoas buscam sanar suas necessidades sociais de outras maneiras.
Nos dias de hoje, principalmente com a ascensão das mídias sociais, a internet permite que de certa forma as pessoas possam suprir suas necessidades sociais. Mesmo pessoas socialmente bem-sucedidas buscam na internet formas de potencializar suas possibilidades sociais. Para isso temos os instant messengers, listas de discussão, redes sociais, blogs, sites para avaliações e resenhas, vídeos, social bookmarks, leilões e classificados online, fóruns e comunidades de objetivos específicos. Todas essas aplicações devem ter uma interface fácil de usar, mas acima de tudo é preciso que elas possuam boas metáforas humanizadas, para que isso facilite a resposta correta dos usuários durante as interações com outras pessoas. Isso será mais importante que a usabilidade para se obter sucesso com as aplicações.
Interface social vs. usabilidade
Joel Spolsky escreveu o artigo It’s Not Just Usability, que é um texto bem interessante para essa discussão. Nele, Joel comenta o caso do Napster, que foi o primeiro software de compartilhamento de arquivos em redes P2P que ganhou grande destaque mundial (principalmente pela briga jurídica com a indústria fonográfica). Joel explica que na janela principal do Napster existiam botões para que o usuário alternasse entre as telas, botões onde deveria haver abas. Essa era uma grande falha de usabilidade, pois ia contra um princípio que faz referência a tudo aquilo que é fisicamente possível de ser realizado (affordability). Porem essa falha não impediu que o Napster fosse o software mais usado do mundo no seu momento, e tudo isso por questões que iam além da usabilidade. O Napster possibilitava o compartilhamento de arquivos entre pessoas, e esse tipo de interação atraia cada vez mais usuários.
O Facebook é outro caso onde a usabilidade não foi um fator decisivo para o sucesso. Quem assistiu o filme The Social Network pode ver que Mark Zuckerberg, o criador do Facebook, era um programador que não entendia muito de interface, mas tinha uma preocupação constante de que o Facebook fosse um ambiente legal para as pessoas, oferecendo aquilo que elas queriam. As primeiras versões do Facebook possuíam uma fraca usabilidade em termos de sistema, porem o sucesso veio quando o seu criador percebeu as necessidades sociais das pessoas que o cercavam, como a possibilidade de conhecer, conversar, e saber informações sobre a vida de outras pessoas, podendo iniciar o contato sem uma abordagem direta, que pudesse oferecer algum risco a integridade moral e social da pessoa. A partir do momento que o Facebook começou a oferecer ferramentas que ajudavam essas pessoas a suprir certas necessidades sociais, ele começou a se tornar o sucesso que é hoje.
Foco na interação entre pessoas
Em meados de 2003, sites de fotografia como o Photoworks e Ofoto (que se tornou o site da Kodak) possibilitavam que usuários carregassem imagens para impressão e outros serviços. Apesar desses sites permitirem algumas interações sociais, como o compartilhamento de fotos com amigos e familiares, a interface social era vista apenas como um adendo, não estando incluída na concepção do projeto.
Porem em fevereiro de 2004 o lançamento do Flickr mudou todo o conceito existente até então. A interface social foi considerada como um elemento essencial no design da interface, possibilitando aos usuários a criação de toda uma rede em torno das fotografias, adicionando contatos e acompanhando as suas últimas atualizações, permitindo que as imagens estivessem disponíveis para a visualização do público através de diferentes licenças de compartilhamento, e facilitando a organização e a busca dessas imagens através da folksonomia. Uma rede social em torno das fotografias, uma experiência que nenhum site havia criado até então. Uma inovação que trazia a interface social no projeto desde a sua concepção, e que posteriormente veio a inspirar muitos outros projetos.
Defina os seus objetivos sociais
Em qualquer projeto de interface, antes de se preocupar com a usabilidade do produto, é preciso pensar em qual é a sua real utilidade, e quais tipos de desejos ele desperta nos usuários. Mas, para além disso, também é preciso saber exatamente quais são os objetivos sociais. A internet é um espaço social, e ao criarmos aplicações utilizando esse espaço, precisamos pensar nos projetos de uma forma menos técnica e matemática, e começarmos a pensar nas interações de forma mais antropológica e etnológica. Acima de tudo, é preciso manter o foco na interação entre as pessoas.