“O boxe é um ato anti-natural, porque tudo nele é ao contrário. Se quiser ir para a esquerda, você se apóia do lado direito. Para ir para a direita, use o dedão esquerdo. Às vezes o melhor jeito de dar um bom soco é recuando, mas se recuar demais você acaba derrotado. Em vez de fugir da dor como gente normal faria, você vai em direção a ela!”
Não, eu não sou pugilista. Para falar a verdade, que eu me lembre eu nunca briguei, nem na escola. Mas depois de assistir mais de cinco vezes o filme Menina de Ouro e quase decorar as lições narradas por Morgan Freeman, eu fico achando que sei tudo sobre boxe.
Mas por que boxe em um artigo sobre inovação?
Bem, simplesmente porque da última vez que vi esse filme e ouvi essas lições, começaram a me ocorrer analogias entre o boxe e a inovação. E surgiu a seguinte questão na minha cabeça: a inovação hoje também é um ato anti-natural?
Assim como eu afirmei em um artigo anterior que design é uma palavra que está na moda, vou sugerir agora que inovação é a palavra da vez.
A competição e o volume de produtos do mercado capitalista, que faz com que ele esteja constantemente saturado, obriga empresas e profissionais a investir em inovação. Aliás, isso torna-se cada vez mais necessário para a renovação do mercado e venda de produtos. Mas muitos ainda têm o pensamento pouco sintonizado com o que realmente é inovação.
E o que significa de fato inovar?
Vemos muitas pessoas associarem a idéia de que para haver inovação, basta haver criatividade. Porém temos que entender que essas palavras não são sinônimos. Se formos entender a criatividade como a geração de novas idéias, podemos então entender a inovação como a implementação bem sucedida dessas idéias. Sendo assim, não basta ter boas idéias se não estiver apto a implementá-las.
Criatividade é apenas o primeiro passo para que se possa inovar. E, além de boas e novas idéias, devemos saber reconhecer oportunidades para poder aplicar as novas idéias na prática, solucionando problemas de forma bem sucedida e obtendo demanda no mercado. Ai sim teremos algo inovador.
Hoje, a área do conhecimento mais preparada para gerar novas idéias e criar estratégias bem fundamentadas para implementação é o design, por ser cada vez mais uma área projetual com foco no público alvo e em formas de cativá-lo, não apenas esteticamente.
Algumas empresas vão aos poucos tendo essa percepção e escalando designers para trabalhar não só na criação estética, mas na criação de estratégias e planejamento de vendas de produtos e serviços, coisa que era naturalmente responsabilidade dos profissionais de marketing.
Design é área multidisciplinar
Isso faz também com que o design seja uma área cada vez mais multidisciplinar, fugindo da natural grade curricular de antes e agregando para si diversos outros conhecimentos e valores, não se limitando mais a disciplinas de artes.
Hoje, em um mercado cada vez mais saturado de produtos e serviços, e com a globalização e a tecnologia encurtando cada vez mais as distâncias para a concorrência, o sucesso de uma empresa ou de um profissional está diretamente ligado à sua capacidade de criar, repensar e reinventar. Ou, sintetizando, na sua capacidade de inovar.
E sendo a criatividade o primeiro passo para a inovação, o que as empresas e profissionais andam fazendo para estimular seu processo criativo?
Por mais que para ser criativa uma pessoa dependa em boa parte de talento, não acredito que exista apenas um seleto grupo de indivíduos dotados de tal capacidade, privilegiados por uma inspiração divina. Toda pessoa, desde que seja estimulada e se auto-estimule para isso, é capaz de criar novas idéias.
Inovação e custos
Vejo que para muitas empresas e profissionais, inovação acaba sendo um sinônimo natural de grandes investimentos, seja na investida em consultorias, contratação de especialistas, investimento em novos equipamentos, melhor remuneração de seus profissionais ou até mesmo a terceirização de serviços.
Como muitas empresas se vêem sem recursos financeiros para tais investimentos, logo pensam estar sem alternativas. Os custos poderiam ser bem menores se o investimento fosse direcionado à capacitação dos profissionais de design que integram a sua equipe. Na verdade é um erro associar sempre inovação a investimentos financeiros. A primeira atitude para se chegar à inovação está na verdade numa mudança radical de costumes, pensamento e postura.
Um pensamento antiquado, mas que parece ainda muito natural em muitas empresas, é a idéia de estimular a produção criativa através de individualização de tarefas, estimular a competição interna ou premiação financeira dos funcionários, ou até mesmo exercendo certa pressão sobre o processo criativo ou sobre a implementação de novas idéias obtidas. Porém, com esse tipo de pensamentos e atitudes, o que acontece é o oposto, acaba-se na verdade por travar o processo criativo e a implementação satisfatória de idéias.
Aqueles que almejam a inovação e o sucesso naquilo que fazem devem entender que a criatividade depende de diversos fatores, que devem ser estimulados e trabalhados, como as experiências profissionais e pessoais, o conhecimento técnico e a capacidade de enxergar os problemas por novos ângulos.
O ambiente de trabalho
O ambiente de trabalho deve primar pela coletividade, pela colaboração e comunicação de uma equipe, mas ainda assim pela autonomia e liberdade de cada indivíduo. Deve-se investir na satisfação dos membros da equipe, ter a preocupação de que cada pessoa tenha prazer naquilo que faz.
Qualquer ambiente de trabalho que prive os membros de uma equipe de boas relações interpessoais, de boas experiências, que sufoque os indivíduos com prazos e horários, com exigências autoritárias que retalhem a produção intelectual exigindo foco exclusivo nas tarefas, que não permita pausas para arejar os pensamentos e que não prime pela satisfação pessoal de cada um, está fadado ao estancamento da criatividade e à falta de inovação.
Assim como no boxe “o melhor jeito de dar um bom soco é recuando”, para inovar não se deve deixar levar pela afobação de resolver um problema, mas recuar um instante e estudar a situação, trabalhar em uma nova idéia consistente que possa solucionar um problema real e ter assim uma aceitação do público e definir uma boa estratégia. Mas para fazer esse pequeno recuo, deve-se ter a certeza que sua equipe está apta para essa tarefa. E caso essa não seja a realidade, não é substituindo membros da equipe que se conseguirá o êxito.
Afinal, o novo profissional também vai estar inserido nesse ambiente de trabalho pouco propício e haverá períodos de treinamento ou adaptação que podem tornar esse recuo grande demais. E, assim como no boxe, se recuar demais você acaba derrotado.
Enfim, vemos muito mais iniciativas que rompem essa antiquada linha de pensamento e postura nos Estados Unidos e Europa. Porém no Brasil, esse pensamento antiquado ainda parece para muitos ser o caminho natural.
Se você então anseia a inovação, rompa com velhos pensamentos e busque a (r)evolução de seus conceitos e paradigmas. E a despeito do que ainda é naturalmente estabelecido, tenha uma boa atitude anti-natural.
Para se aprofundar no tema “inovação”, recomendo a leitura dos artigos de Ellen Kiss, mestre em Design Management e consultora em branding.